Cuidas pouco de mim
Perdoe-me! Não que quisesses que fosse assim!
Quisera eu que fosse como quando é
Quando me atende com teus olhares
E transcendes a minha carne
E transformas cada pedaço em símbolos
Cada membro em mistérios
Mistérios teus, queira Deus os poder suportar
Pois há de se falar naquele amor a si mesmo
Que quando aos seus olhos encontram a grandiosa beleza
Encontra senão a beleza que de si projeta
Ama a si mesmo quando num ludibrio diz amar ao outro
Ah! Estremeço só de saber que pode ser assim!
Que queres atear os teus fogos em mim
E não sei se quando a mesa virar se vais gostar do que enxergar
Quisera eu que fosse como quando é
Quando teus braços me acenam discretamente
Como num sussurro que não diz
Mas que não se pode deixar ignorado o que se tem a dizer
Vai que gostastes mesmo de mim!
Vai que dilatastes a alma, perdestes a calma
E renunciastes a euforia
Vai que me dizes mesmo o que pensas
Sem se deixar enganar pelas fantasias dos versos que lestes
Dos ideais que escrevestes em profundas e inalcançáveis linhas
Vai que deixastes ser minha só porque a si mesmo possuístes
E aprendestes a doar-se de nada carecendo
E nos teus olhares me falastes que amou o assombro
De enxergar tão para longe de si o outro
O outro que sou eu
Que não sei se conhecestes ainda meu nome
Ou se sabes mesmo o linguajar meu
Se sabes porquê gosto ou desgosto
Porquê sou seu e porquê sou meu
Mas o que aqui digo é que cuidas muito pouco de mim
Quando me olhas assim e parte como se não fizesses parte
Como se não fizesses parte de mim
E eu de você? Seria algo também assim?
Partes de mim como a mãe deixa a criança sem saber
Como será o universo dela, tão pequeno, dali em diante
Parte de mim, aquela parte em que cabem todos os sentimentos
Cabem a razão, a não razão, o amor, a paixão...
Qual será maior a partida
Quando partes e parte tudo o que fica por aqui?
Qual será o maior então afinal se tudo isso que se diz ser maior
Cabe num recipiente tal?
A confusão é tanta que não há que se não render
Que maior é o amor que tudo sustenta
Ele sim suporta que o abandones quando vais embora
Mas sou muito menor que o amor
E se me amaste no que se de mim viu
Então também sou menor que tu
É isso que me trazes em tamanha iminência
A desgraça minha desse amor com que me amas
Não que sejas eu o teu predileto
(Esse engano guardo só pra mim!)
É a cadência do amor não tão quieto
Intranquilo
Tanto que me pego descansando em ti!
Se com esses versos ainda não enxergastes
Permita-me ainda prosseguir àquela rua escura
E a solidão é dura quando estás tão longe e tão perto assim
Que isso nem seja chamado de solidão, e que nem mesmo seja
Não é o que o verso diz
É o que me tiras de mim: teus sorrisos, tuas carícias, tuas palavras...
Não me destes nada nem nada me prometestes
Nem mesmo os teus sorrisos, tuas carícias, e as tuas palavras...
Não que eu possa sentir isso, por causa desses castos moralistas
Que têm tudo numa pequena lista
De como que se deve e não existir
A isso dão o nome de loucura
De tudo isso devo pedir perdão, devo me arrepender
Para conservar minha alma pura
Mas perdoem-me a discordância
É que há uma distância entre o que se compreende
E o que se quer de mim compreender
Que o proibido é o inserido
Por estes que nem sequer com um dedo
Podem aproximar aquilo que aconselham
Do que tornam a fazer
É que o teu carinho, o teu afago
São obras da carne ou do Diabo
Se assim é, que belo inferno o que vivo
Onde um feito de amor não é proibido
As delícias das carícias não carregam o conteúdo do perverso
E o deleite um no outro não é egoísta
Não defendo o amor, ele que defenda a si mesmo
Desses que insistem em acusá-lo
De ter nascido ou brotado
Esses que se sentem puros
Que nunca foram amados para além do mandamento amargo
Nunca viram doçura
Veja que bobagem a minha
Já me levantando contra tal tirania
A do covarde e a da covardia
Mas se tu estivesses aqui
Não estarias pensando nada disso
Estaria enredado por outra esfera
Aquela em que quando entro
Faz pensar aos outros tudo quanto é vil
E quem me viu com ela
Escandalizou-se, ou irritou-se
Com essa paixão que sempre ouviram falar
Que chega de assalto, sem avisar
E que nunca bateu às portas deles
Mas quero deixar bem claro
E isso nem é raro
Posto que claramente deixo estar todas as coisas
Sempre quando quis faltar à escola
A verdade que dissera a meus pais fora a minha esmola
Para quem quisesse um dia me acusar
Nunca fui de inventar notícias
Nem de esconder comportamentos
E também nunca me senti obrigado
A falar sobre nenhum deles
Quando me mantive calado
Calado quis estar e dizer algo não podia
Meu amor era proibido
Era proibido, meu amor!
Era proibido!
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