sexta-feira, 10 de agosto de 2007

A PRINCESA E A FEITICEIRA



Eu vi a princesa dos meus sonhos. Ela é linda, mas linda não é uma palavra que a classifique bem, ela é UM SONHO. ... Quando a vi pela primeira vez, tive a certeza que já a conhecia, já havia visto o seu rosto há anos e anos, já havia olhado nos seus olhos há muito, muito tempo. Ela sempre esteve rondando os meus sonhos, passeando pelos meus desejos... Linda, meiga, misteriosa... Silenciosa por saber se expressar através do silêncio; eu, no entanto, quando a vi, não disse nada por não saber o que dizer. Permaneci boquiaberto e admirado. Seus olhos nunca me foram estranhos, já os tinha visto, e minha reação foi a de quem leva um choque emocional, não de quem a via pela primeira vez, mas o choque de alguém que se re-encontrou com ela. Sim, um reencontro! Com aquela que já existia dento de mim, em algum lugar; em minhas projeções psicológicas e emocionais acerca daquela que deveria ser, para mim, o símbolo perfeito de um ser feminino. Ao vê-la, o choque que sofri não foi o de ver apenas uma "bonita garota". Não, de fato, não. Vi o mundo dos sonhos colidir-se com o mundo real. Aquilo que era apenas uma projeção, uma imagem em minha mente, tomou forma e beleza bem diante dos meus olhos. Aquela a quem via apenas quando fechava os olhos, passei a ver de olhos bem abertos. Enquanto dizia a mim mesmo que tudo era um sonho, tinha que aceitar que, também, ela era real. Disse a mim mesmo, então, que, ela era a realidade-em-sonho, e um sonho-em-realidade. Meus sentimentos foram de paz e pavor, medo e amor, provocados pela sua presença que silenciou todos os ruídos e que fez todos à sua volta tornarem-se coadjuvantes de um filme que era só dela, e a cena era só ela. Uma cena que se congelou, como um Pôr-do-sol que se fixou no tempo e eternalizou-se, não mais passou. Sim, era a certeza de um reencontro, a única certeza era essa: De já haver conhecido-a dentro de mim.

... Ela me fez ver o que anos morando na mesma cidade passou-se despercebidos: luzes alaranjadas refletindo na lagoa; as águas tomaram vida própria e dançavam, com a ajuda da grama suave e rasteira que delineava seus limites; árvores-machos vestidos de terno riscado eram coqueiros galanteadores da noite; outras árvores-fêmeas vestidas com vestidos bem coladinhos modelando o belo corpo, como se o vestido fizessem parte delas; o céu, apaixonado, observava; o orvalho dava um toque todo especial ao belo cenário; mas toda a beleza da cena reverenciava-se diante do sonho e desejo, meus, que se tornara realidade ao tomá-la nos braços perante aquele teatro montado por Deus, sonho que se fizera carne e osso em meus braços. Ela era toda bela, era toda a sensação de estar tocando um sonho, sentindo-o nos meus braços, na ponta dos meus dedos, até então, beijar seus lábios. ... Ela me fez desistir de olhar para o alto buscando a beleza das estrelas, dos cometas, da lua, enfim, fez meus pés pousarem em paz e suavidade mostrando-me que o que procurava no misterioso e infinito céu não estava lá, mas aqui, na Terra, bem diante de mim...

... Mas... Também conheci uma feiticeira. Embora a princesa não tivesse “nenhum” motivo para o ser, a feiticeira tinha todos. Ela tinha que ter. Ela não era bela, nem meiga, nem misteriosa, não para mim. Até que me aproximei dela. Sua voz, em princípio, me pareceu amigável, mansa; seus olhos pareceram-me aceitar-me sem nenhum receio; o calor dos seus braços e de todo o seu abraço me vieram como um refúgio, um abrigo ante a solidão, à dor.

... Era agradável a sua presença, tanto, que parecia, por vezes, me fazer esquecer aquela, agora, distante princesa. Sim, pois, a feiticeira, tinha a magia de cativar... Seus gestos, seu jeito, sua companhia... Ela era toda magia e encanto. Mas era tudo isso porque havia motivos ou razões de ser, o que a diferenciava da princesa dos meus sonhos. Por um momento quis me deixar levar pelos seus feitiços, seus sorrisos, mas nada disso existia em mim; não re-conhecia nenhuma de suas magias e truques, me eram estranhas. Estranhamente-agradáveis, ironicamente-estranhas.

... A junção das duas seria a perfeita desgraça a se fazer. Não seria uma soma. Seria uma mutilação. Se perderia a realeza de uma e os feitiços-encantados da outra. Se criaria um ser segundo os meus medos e meus caprichos. Deus olharia para a minha criação e diria: Isso não é bom!

... Enfim, as duas são feiticeiras de alguma forma... Uma encanta pela beleza perdida que reencontrei nela, a outra encanta pela beleza que lhe é própria... Uma enfeitiça pela cena que ela cria no meio do nada, bastaria apenas ela e tudo estaria perfeito, a outra encena, atua, e assim enfeitiça... Uma possui a arte da magia dos sonhos, a outra possui a magia da terra, ela cativa... O que de fato diferencia as duas é que: a falta da princesa mexe nas estruturas de minhas esperanças, a falta da feiticeira me faz falta.

... Consultei um mago que tudo entende, ou quase tudo, de princesas dos sonhos e feiticeiras. Ele me disse que a princesa por mais que esteja presente ela estará ausente, sempre. Disse-me que ela existe dentro de mim tal como uma saudade da eternidade, do eterno, do paraíso... Essa imagem da princesa por mais que seja um pássaro que pousou sobre alguém uma hora ele irá voltar de onde veio, e então, descobriria que o rosto da princesa, a imagem em minha mente, não é o da pessoa, a quem pensei ter visto nela o que vi dentro de mim, e assim voltaria à saudade do que nunca conheci.

... Aconselhou-me a ficar com a princesa ou feiticeira que soubesse contar estórias, conversar.
... Por causa dos seus vários conselhos me perguntei sobre aqueles que se entregaram aos prazeres gulosos da lascívia, se eles teriam alguma vez encontrado esse erótico prazer do diálogo do qual me disse o mago.

... Por causa de suas palavras, também tive medo da dor e da solidão de não encontrar na pessoa, a qual via nela a minha princesa, a mesma coisa de antes... Os mesmos encantos e re-encontros. Embora também tivesse medo de me entregar à feiticeira sem nunca ter visto nela aquilo que habita dentro de mim.

... Pergunto-me se o amor vale a pena!

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

UMA CRIANÇA CHORA



... Braços ternos o envolve. Terno amor, terna bondade e gratidão. Ele não existia e passou a ser. Olhos sobre ele de quem contempla o universo em suas mãos. A vida, uma vida inteira nos braços. Olhos admirados, estupefatos. Ele veio à luz mas reluziu mais que qualquer estrela seja de quinta ou sexta, ou ainda, sétima grandeza. O Criador entoou uma canção que só havia três pequenas palavras: “É muito bom”! Repetiu esse canto passeando pelo jardim, e o jardim também cantava, as aves dos céus cantavam, as feras do campo, os répteis, os peixes, o Sol e a lua, as estrelas, o vento assobiava não pelo seu canto, mas pela sua descontrolada dança. Era festa, os anjos estavam diante Dele e havia alegria diante de seus olhos, muita alegria. O recém nascido apenas, ainda de olhos fechados, recostava a sua cabeça nos seios maternos do Pai. Apenas descansava.
Veio os primeiros anos e o Pai-Mãe era “coruja” demais da conta, como diria os mineiros. Ele vinha, brincava, falava um monte de coisas sem sentido fazendo voz de bobalhão e “pagando mico” pra toda a natureza ver. Os animais faziam “xixi no pêlo” de tanto rir do Pai-Mãe bobalhão. Ele ensinava a geografia do jardim da vida, mostrava-lhe as águas, ribeiros, libélulas fazendo pousos forçados nas pequenas lagoas... Parecia que quem veio à vida foi o Pai, quando descobriu a maternidade. O recém nascido apenas descansava contemplativamente de olhos fechados. Talvez estivesse mais interessado nos movimentos cadenciais do coração do Pai-Mãe, que ora acelerava e dizia-lhe algo que ele entendia, sentia que Ele estava feliz pelo acelerar do coração, e quando o coração se acalmava voltando aos batimentos cardíacos normais a criança sabia, Ele estava olhando ela, contemplando o seu descanso em plena confiança.
O que? Se me lembro de tudo isso? Não, de fato, não. Só sei que sinto saudades. Saudades do que não me lembro, da nostalgia que me possui todo fim de tarde, bem ao Pôr-do-Sol.
Quando uma criança acorda para a vida, ela é acordada abruptamente como quem deve acordar cedo e já está atrasado para o trabalho. Ela é acordada pela pressa, pela ansiedade, pelo caos, pelo mundo adulto, pela agonia, pelo medo, pelo poder, pela aflição, inquietação, desespero, pela morte. Ela tem que deixar de ser quem era, tem que ser o que o nosso mundo manda, adulto, idiota. Assim, todo o amor, ternura e bondade aprendidos pelo pulsar daquele coração bem aos seus ouvidos o dia todo, é substituído pelo pulsar dos ponteiros do relógio: o tempo substitui a eternidade. O Criador é substituído pelo “Eu Tenho”, o “Eu Posso”, “Eu Faço”, enfim, o predicado não importa muito, só o “EU”.
Poucos são os que não se deixam levar, talvez, um insignificante número.
Mas a criança tem saudade daquilo que ela não se lembra mais. O tempo substitui a eternidade, mas não a pôde matar. Ela continua lá, gemendo, saudade do seio da maternidade do Pai.
Quem se lembra dos primeiros anos de vida? As primeiras horas, dias, meses? Todos nós estivemos lá. Viemos à luz. E o que vimos? Você se lembra? Lembra-se das batidas do coração da mãe fazendo-o dormir em confiança? Lembra-se da festa pela sua chegada? Não, estou convencido de que não. Mas a criança estava lá. Sentiu. Tocou. Se envolveu como nunca. Não é possível alguém, mesmo sendo ainda muito novo para guardar imagens na mente, ter esquecido tanta ternura, um encontro tão de alma. Sim, de alma. Talvez ela se lembre. Porque não? Os olhos ainda eram fracos de percepção, a mente ainda imprópria, o tato ainda sem saber o que de fato era... Mas a alma... Sopro do divino...!
Ela fotografou, guardou a cena, registrou os momentos, os primeiros e todos os outros. Ela tem o filme com todas as cenas, todas as percepções. A alma.
Pobre alma. Habita em trevas dentro do esquecimento. Alguns a trancaram dentro dos templos religiosos, outros em vícios, outros em vícios, outros em vícios, até mesmo, os vícios religiosos. A criança se tornou uma viciada na “realidade”. Vive pelas esquinas fumando estradas sem fim, sem perceber o caminhar em círculos, perdidas.
Mas há crianças que desejam acordar, se contorcem por dentro. A alma fala e a criança grita por querer libertar-se. Mas é aí que acontece a maior tragédia. A criança até acorda, mas não vê a festa, não ouve o coração pulsar bem pertinho de seus ouvidos, não vê a natureza cantando mas gemendo de dor, não vê o Sol alegre mas em enfadonho trabalho de nascer e se pôr. Ela acorda e acorda sozinha, ninguém pode consolar sua opressão, não entendem. Se quiser chorar, tem de chorar sozinha. Se sorrir, tem de sorrir sozinha, as outras crianças perderam a arte de sorrir e de chorar. Então, tem de lembrar das estórias de um recém nascido... Ela descansa, fecha os olhos e se recosta nos seios do Pai e ouve o coração de uma Mãe. Sozinha ela visita o seu interior e vive a saudade do Eterno. Mas os olhos devem ser abertos novamente, então ela chora.
Um dia retornaremos ao Primeiro dia de nossas vidas e teremos então toda a eternidade em descanso nos seios maternos do Pai , e não mais precisaremos fechar os olhos e nem chorar.


C.Wesley

MEU AMIGO, ALGUMA COISA ESTÁ MUDANDO

Alguma coisa está mudando meu amigo E não sei bem o que é Mas se lembra quando tudo apenas se repetia Então mudanças já são boas...